Por trás do prestígio momentâneo que a vida pública proporciona, muitos ex-deputados enfrentam, após o fim dos mandatos, uma realidade de invisibilidade e dificuldades. O caso de Otoniel Fagundes Saraiva, deputado estadual baiano entre 1995 e 1999, é um retrato vívido dessa transição marcada por desilusão e luta por dignidade.
Hoje presidente da Associação dos Ex-Deputados da Bahia (Assed-BA), entidade fundada por ele há cerca de um ano e meio, Saraiva revela um cenário bem diferente daquele imaginado ao deixar a Assembleia Legislativa da Bahia. “Deixei o mandato e passei 15 anos sem pisar na Assembleia. Percebi que era tratado como um ilustre desconhecido”, lamenta. “Falei com Coronel que ex-deputado não valia nada. Aí nasceu a Assed.”
A entidade surgiu como tentativa de resgatar o respeito ao legado político de parlamentares do passado. Mas logo o ex-deputado se deparou com histórias alarmantes: ex-colegas vivendo de vender bugigangas em feiras, outros enfrentando situações financeiras tão graves que obrigaram amigos a se reunir para quitar dívidas de poucos milhares de reais.
Segundo Saraiva, a Bahia teve 690 deputados estaduais nos últimos 40 anos — 390 ainda estão vivos e cerca de 300 viúvas também são filiadas à associação. Boa parte dessas pessoas vive hoje em condições de vulnerabilidade. “A barra é pesada. Confesso que tem horas que dá vontade de desistir”, desabafa.
Uma trajetória política marcada por mudanças
Natural de Alagoinhas, Otoniel Saraiva nasceu em 1951 e construiu uma sólida formação acadêmica em Economia e Direito. Atuou no setor privado antes de entrar na política e foi eleito deputado estadual pelo PSDB em 1994. Durante o mandato, porém, migrou para o PL e, posteriormente, para o PSC, partido que chegou a presidir na Bahia entre 1996 e 1997.
No Parlamento baiano, teve atuação marcante em temas como combate à fome, direitos da mulher, recursos hídricos e defesa do consumidor. Também foi ativo em demandas voltadas à sua terra natal, como a criação de cursos universitários, delegacias e postos de saúde. A chegada da Cervejaria Schincariol a Alagoinhas, por exemplo, foi um dos marcos de sua articulação política.
Mesmo com uma atuação extensa, seu pós-mandato foi silencioso e solitário. Após deixar o cargo, presidiu o Alagoinhas Atlético Clube e passou a advogar. Hoje, à frente da Assed, tenta evitar que a memória e a dignidade dos ex-parlamentares sejam esquecidas pela própria estrutura que ajudaram a construir.
A política que empolga e descarta
A história de Saraiva evidencia uma contradição frequente na política brasileira: a glória momentânea do mandato versus o esquecimento sistemático do ex-parlamentar. Enquanto campanhas milionárias movimentam os bastidores, quem já contribuiu para o funcionamento da máquina pública muitas vezes termina relegado à invisibilidade — ou pior, à miséria.
Em tempos de redes sociais e vaidades digitais, como bem ilustra o presidente da Assembleia, Ângelo Coronel, ao exibir o ranking de seguidores entre os políticos baianos, a realidade dos bastidores humanos da política é bem mais dura e exige atenção.
Com quatro filhos e uma história de vida marcada por luta, Otoniel Saraiva hoje representa não apenas a sua própria causa, mas a de centenas de homens e mulheres que, após deixarem o cargo, continuam buscando algo que deveria ser básico: respeito.

